domingo, 7 de fevereiro de 2010

Onde tem UPPs tem Biroscas também - Concurso elege as 12 melhores biroscas do Cabritos e da Tabajaras

Pés sujos nos holofotes



Um roteiro diferente começa a se formar nas favelas que já contam com Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs): o das biroscas.

No Morro dos Cabritos e na Ladeira dos Tabajaras — que cortam os bairros de Copacabana e Botafogo —, 12 delas foram eleitas como as melhores entre 52 que concorreram em um concurso promovido pela associação de moradores. São estabelecimentos pequenos, na maioria das vezes informais, mas esbanjam simpatia e servem uma cerveja tão gelada que faz até doer os dentes.
— Esse é o ponto certo. A cerveja tem que estar quase congelando na hora de ser servida — contou Carlos da Conceição Souza, o Deroso, de 34 anos. O apelido virou o nome da birosca que ele tem há seis anos e já virou uma extensão de sua casa. Quando o balcão está vazio — coisa rara — Deroso aproveita para fazer exercícios ou brincar com o filho Douglas, de 1 ano.
— Aqui lota nos dias de jogo: fica gente até na calçada do outro lado da rua — disse ele.

Os cerca de 30 troféus já conquistados pelo Jaca Verde — time da comunidade em que Deroso joga — compõem a decoração da birosca e são motivo de orgulho. Assim como os petiscos que saem da cozinha:

— O frango à passarinho é imbatível — contou ele.

Mais adiante, encontra-se o Bar da Dona Ana. Lá, o público é outro: os cearenses que moram na comunidade e, para matar a saudade de casa, não resistem a um forró.

— Às sextas, um grupo toca ao vivo. O palco é a parte mais alta da calçada. A rua fecha por causa do mundaréu de gente que vem arrastar os pés — disse Ana Maria Rodrigues, de 57 anos, que há 20 recebe os fregueses na janelinha da birosca:

— Quem quiser comer alguma coisa, traz e eu preparo. Só cobro a mão de obra.

Idealizador do concurso, o professor de marketing Daniel Plá acha que esse tipo de ação é uma forma de todos descobrirem os tesouros das comunidades, antes escondidos pela violência do tráfico:

— Uma exposição com as fotos das biroscas ganhadoras será aberta amanhã, na associação de moradores, para comemorar essa nova fase.



Alguns dos selecionados, visitados pela equipe do EXTRA:

Bar do Deroso - É onde se reúnem os atletas. As meses são espalhadas nas calçadas. Além da TV, há também uma mini-aparelhagem de DJ.
Bar da Dona Ana - Ponto de encontro os cearenses. O atendimento começa quando chega o primeiro freguês e só termina quando o último sai.
Bar da Baiana - Aline Gomes dos Santos é responsável pelo atendimento no balcão. Na cozinha, sua mãe e seu pai capricha nos petiscos para acompanhar a cerveja: batata frita e linguiça são os que mais saem.
Sendão - Wendel Souza Mendes Santos espera a todos com cerveja gelada, X-tudo e mini-pizza. Para as crianças, há um videogame à disposição.
Cantinho da Rô - O forte são os lanches preparados por Rosângela Moraes Elias Bernardo. A meninada adora os quitutes elaborados por ela e, até de madrugada, fazem fila para prová-los.



Palavra de especialista


"A birosca na favela tem a mesma função e importância social que tem o botequim no asfalto, qual seja, a de servir de ponto de encontro entre os fregueses, formando uma espécie de clube social. Lá, as pessoas se informam sobre as novidades da comunidade, trocam confidências, brincam, choram, criam, se divertem. Pois, apesar dos guias e do marketing em torno dos botecos, botequim no Rio tem mais a ver com boemia do que com serviço. Tem mais a ver com encontrar os amigos, paquerar e beber, do que fazer programas gastronômicos e experimentar iguarias, embora isso não esteja descartado. Com o tempo, sem o entrave de milícias e de traficantes restringindo o acesso, pode ser que as biroscas se integrem no roteiro boêmio da cidade de forma mais ampla. É questão de esperar para ver."



Paulo Thiago é jornalista

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